quarta-feira, 9 de junho de 2010

Pra comemorar o Dia dos Namorados


Ontem postei: "Venha ver o pôr-do-sol", da Lygia, hoje, ainda em comemoração ao Dia dos Namorados, leiam Drumonnd:

Ter ou não ter namorado? Eis a questão

Quem não tem namorado é alguém que tirou férias não remuneradas de si mesmo.
Namorado é a coisa mais difícil das conquistas. Difícil porque namorado de verdade é muito raro.
Necessita de adivinhação, de pele, saliva, lágrimas, nuvem, quindim, brisa ou filosofia. Paquera, flerte, caso, transa, envolvimento, até paixão, é difícil. Mas namorado mesmo, é muito mais difícil.
Namorado não precisa ser o mais bonito, mas ser aquele a quem se proteger e quando se chega ao lado dele a gente treme, sua frio e quase desmaia pedindo proteção.
A proteção dele não precisa ser parruda, decidida ou bandoleira: basta um olhar de compreensão ou mesmo de aflição.
Quem não tem namorado não é quem não tem um amor: é quem não sabe o gosto de namorar.
Se você tem três pretendentes, dois paqueras, um envolvimento e dois amantes, mesmo assim pode não ter nenhum namorado.
Não tem namorado quem não sabe o gosto da chuva, cinema sessão das duas, medo do pai, sanduíche de padaria ou drible no trabalho.
Não tem namorado quem faz pactos de amor apenas com a infelicidade ainda que rápida, escondida, fugidia ou impossível de durar.
Não tem namorado quem não sabe o valor das mãos dadas, de carinho escondido na hora em que passa o filme, e de flor catada no jardim da vizinha e entregue de repente, de poesia de Fernando Pessoa, de Vinícius de Moraes ou Chico Buarque lida bem devagar, de gargalhada quando fala junto ou descobre a meia rasgada, de ânsia enorme de viajar para a Escócia ou mesmo de metrô, bonde, nuvem, cavalo alado, tapete mágico ou foguete interplanetário.
Não tem namorado quem não gosta de falar do próprio amor, nem de ficar horas e horas olhando o mistério do outro dentro dos olhos, quem não gosta de dormir agarrado, fazer a sesta abraçado, fazer compra junto, ficarem abobalhados de lucidez do amor. Não tem namorado quem não redescobre a criança própria e a do amado e sai com ela para parques, fliperamas, beira d’água, show do Milton Nascimento, bosques enluarados, ruas de sonhos ou musical da Metro.
Não tem namorado quem não tem música secreta com ele, quem não dedica livros, quem não recorta artigos, quem não se chateia do fato do seu bem paquerado, quem ama sem gostar, quem gosta sem curtir, quem curte sem aprofundar, quem nunca sentiu o gosto de ser lembrado de repente no fim-de-semana, madrugada ou meio-dia de sol em plena praia cheia de rivais.
Não tem namorado quem não confunde solidão com ficar sozinho e em paz, quem não fala sozinho, não ri de si mesmo e quem tem medo de ser afetivo, carinhoso.
Se você não tem namorado porque não descobriu que o amor é alegre e você vive pesando duzentos quilos de grilos e de medos, ponha a saia mais leve, aquela de chita, e passeie de mãos dadas com o mar. Enfeite-se com margaridas e ternuras e escove a alma de leves fricções de esperança.
De alma escovada e coração aberto, saia do quintal, da janela, de si mesmo e descubra o próprio jardim.
Acorde com gosto de caqui e sorria lírios para quem passe debaixo de sua janela.
Ponha as intenções de sinceridade em seus olhos e beba o licor de contos de fadas. Ande como se o chão estivesse repleto de sons de flauta e do céu descesse uma névoa de borboletas, cada qual trazendo uma pérola falante a dizer frases sutis e palavras de galanteio.
Se você não tem namorado é porque ainda não enlouqueceu aquele pouquinho necessário a fazer a vida e de repente parecer que faz sentido.
ENLOU-CRESÇA!!!!
(Carlos Drumonnd de Andrade)

2 comentários:

  1. Carol, eu lembro dessa Cronica, vc passou pra gente na oitava série. Daepediu pra genteproduzir um texto. ou Meu tinha o Titulo ''Ser ou não ser criança...'', tinha ficado bem legal, mas te tenho mais! nossa voltei no tempo agora!!

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  2. Olá Carol, estou degustando esses textos delíciosos =)

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